Uma visita à Grã-Bretanha da relatora especial da ONU sobre o direito à moradia, a urbanista brasileira Raquel Rolnik, gerou uma disputa – com dura troca de palavras – entre a relatora e o Partido Conservador britânico, que governa o país.
Rolnik passou duas semanas na Grã-Bretanha conversando com moradores de baixa renda sobre uma política introduzida pelo governo em abril.
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A política do “subsídio do quarto extra”, como o governo prefere chamá-la – ou “imposto do quarto”, como ficou conhecida informalmente pela oposição – prevê a redução do auxílio moradia pago pelo governo a pessoas que, de acordo com a avaliação do governo, têm mais quartos do que precisam em suas residências alugadas.
O objetivo é estimular famílias pequenas a deixarem propriedades grandes, liberando-as assim para famílias com mais membros, que realmente precisam de mais quartos. Além disso, o governo alega que a mudança gerará uma economia de cerca de meio milhão de libras (cerca de R$ 1,8 milhão) anualmente aos cofres públicos.
Depois de visitar as cidades de Belfast, Manchester, Glasgow, Edimburgo e Londres e ouvir o que diz ser “centenas de relatos”, Rolnik disse à BBC nesta quarta-feira que a política, que gerou protestos na Grã-Bretanha, é um “retrocesso” em termos de moradia.
“Estou muito preocupada com os efeitos negativos e a ameaça de violações de direitos humanos que esta política já esta causando, especialmente para algumas pessoas muito vulneráveis e grupos muito vulneráveis.“
Raquel Rolnik
“Estou muito preocupada com os efeitos negativos e a ameaça de violações de direitos humanos que esta política já esta causando, especialmente para algumas pessoas muito vulneráveis e grupos muito vulneráveis”, disse a brasileira.
Rolnik diz ter ouvido casos de pessoas com deficiências de mobilidade que já haviam adequado suas casas para facilitar os acessos e precisaram se mudar, já que o “imposto do quarto” havia encarecido demais os seus custos.
Falando em nome da ONU, Rolnik – que antes da atual função foi secretária de Projetos Urbanos do Ministério das Cidades durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva – disse que fará uma recomendação para que a mudança seja cancelada.
Desculpas
O presidente do Partido Conservador britânico e ex-ministro de Habitação, Grant Shapps, fez duras críticas a Rolnik, dizendo que suas afirmações são “politicamente tendenciosas”, e citou o problema da habitação no Brasil para refutar os argumentos da relatora da ONU.
“Como é que uma mulher do Brasil – de um país que tem mais de 50 milhões de pessoas vivendo em casas inadequadas – veio aqui (Grã-Bretanha), não conseguiu se reunir com nenhum ministro do governo, com qualquer autoridade do departamento de Trabalho e Aposentadorias, e sequer consegue se referir a essa política pelo nome adequado”, disse ele em entrevista no programa de rádio Today, da BBC.
“Esquerdista brasileira tola, sem nenhuma prova sobre ‘imposto do quarto’, disfarçada de autoridade séria da ONU, foi demolida por Shapps em programa da BBC.“
Stewart Jackson, parlamentar conservador
Posteriormente, a brasileira pediu desculpas por se referir ao programa do governo como “imposto do quarto”, mas manteve sua postura sobre a iniciativa.
Shapps escreveu uma carta para o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, para reclamar de Rolnik e pedir que a organização se desculpe pelo que ela falou.
“Ela claramente veio aqui com uma agenda própria”, disse o político.
Shapps alega que a brasileira sequer teve convite do governo britânico para visitar o país. Já Rolnik afirma que estava na Grã-Bretanha a convite das autoridades locais.
O trabalho da relatora também recebeu duras críticas de outros políticos, como o parlamentar conservador Stewart Jackson, que escreveu no Twitter: “Esquerdista brasileira tola, sem nenhuma prova sobre ‘imposto do quarto’, disfarçada de autoridade séria da ONU, foi demolida por Shapps no programa Today, da BBC”.